O paradoxo das máquinas: NR-12
Na ânsia de tornar os equipamentos industriais à prova de
falhas fez-se uma norma que engessa a produção, cria insegurança jurídica e
gera altos custos , sendo na prática inaplicável. Somente a revisão da NR-12
poderá tornar a indústria mais segura e competitiva
O coração de uma fábrica de parafusos é o setor conhecido
como trefila. As máquinas trefiladoras têm a função de conformar o aço,
dando-lhe as dimensões exatas para a produção de determinado tipo de parafuso.
O aço que chega às fábricas em bobinas é desenrolado e passa pela fieira, a
ferramenta da trefila que lhe altera o diâmetro, para em seguida ser
rebobinado.
Daí a matéria-prima segue para as prensas ou outros
processos que darão forma final aos diversos tipos de parafusos. A Ciser, de
Joinville, líder na América Latina na produção de fixadores, com capacidade
para fabricar 6 mil toneladas mensais de 27 mil diferentes produtos, detém uma
marca notável. Desde a sua fundação, em 1959, jamais foi registrado um acidente
de trabalho envolvendo suas trefiladoras.
O histórico e os procedimentos de segurança adotados pela
indústria, no entanto, não convenceram um fiscal do Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE), que viu “grave e iminente
risco” de acidentes no setor e interditou as sete
trefiladoras – de um total de 10 existentes na fábrica – que estavam em
operação no dia da fiscalização.
A interpretação do fiscal sustentou-se na polêmica Norma
Regulamentadora n° 12 (NR-12), um conjunto de regras do MTE para segurança no
trabalho em máquinas e equipamentos. Após a reformulação da norma, em 2010,
passaram de cerca de 40 para 340 os itens obrigatórios a serem cumpridos por
fabricantes e usuários, ao mesmo tempo em que a nova redação abriu brechas à
análise subjetiva da fiscalização.
TOTAL VISIBILIDADE
Para que pudesse ter os equipamentos liberados, a Ciser teve
que fazer sucessivas adaptações nas máquinas e nos processos. Cada uma das
trefiladoras foi isolada por grades de proteção de quase dois metros de altura
equipadas com chave de segurança. Um dispositivo garante que o acionamento da
máquina só seja feito com a cerca travada. Ainda assim uma segunda chave de
segurança teve que ser incorporada, e sofisticados scanners de movimento
programados para parar as máquinas foram instalados no interior dos cercados,
onde é total a visibilidade dos operadores – para o improvável caso de alguém
saltar a grade com a trefiladora em operação.
Somando-se tais procedimentos à troca de blocos hidráulicos,
instalação de chaves de segurança
nas próprias máquinas e outros ajustes, a conta da empresa
ficou em R$ 1,2 milhão. Mas não foi só.
Durante os dez meses que as máquinas ficaram interditadas a
companhia teve que comprar os trefilados a um custo duas vezes mais alto que o
obtido com a produção própria. Já os novos procedimentos adotados derrubaram a
produtividade do setor em 30%. A encrenca da trefila, que se estende desde
meados de 2012, é só a ponta do iceberg. A fiscalização entendeu que cerca de
700 dos 800 equipamentos da Ciser estão em desacordo com a NR-12, e o
Ministério Público do Trabalho moveu ação civil pública contra a empresa
exigindo a adequação.
CERTIFICAÇÃO
“Quase todos os nossos equipamentos são importados e
certificados pelas normas de segurança da União Europeia e dos Estados Unidos”,
afirma Carlos Rodolfo Schneider, presidente da Ciser. Duas prensas de última
geração importadas há pouco da Alemanha foram consideradas perigosas demais
para operar no Brasil. Para cada uma delas serão necessários R$ 100 mil em
adaptações – o equivalente a 20% de seu custo.
A empresa calcula que a conta total do enquadramento à NR-12
ficará em R$ 40 milhões. “As exigências são excessivas e farão com que talvez
não valha mais a pena permanecermos no negócio”, diz Schneider.
FALTA DE CLAREZA
Os problemas enfrentados pela empresa de Joinville ilustram
o clima de insegurança que se instalou na indústria – paradoxalmente ao intento
da norma, que é justamente conferir segurança para o trabalho com máquinas. Um
dos problemas da NR-12 é que ela se aplica igualmente para fabricantes e
usuários. Ela também impõe obrigações semelhantes para máquinas antigas e
novas. Desse modo, praticamente todo o parque fabril brasileiro mergulhou na
ilegalidade, já que não houve tempo nem recursos suficientes para a instalação
de cercados, sensores, sistemas de monitoramento optoeletrônicos como cortinas
de luz e scanners, comandos de acionamento bimanuais e circuitos de parada de
emergência, dentre outros dispositivos de segurança, até mesmo em pequenos
equipamentos. A incorporação desses itens na escala requerida pela norma
custaria a astronômica cifra de R$ 100 bilhões, segundo cálculo da Confederação
Nacional da Indústria (CNI).
“O pior é que não há clareza sobre o que deve ser feito, não
há um órgão oficial para certificar os equipamentos e sistemas de segurança.
Tudo depende da interpretação do fiscal”, afirma Durval Marcatto Júnior,
presidente da Câmara de Relações Trabalhistas da FIESC. O conceito de “grave e
iminente risco” é considerado subjetivo. A critério da fiscalização do MTE, as
indústrias estão sujeitas a interdições e multas. O número de autuações
quintuplicou desde 2010. Um dos setores mais fiscalizados é o de panificação e
confeitaria, formado por pequenas empresas, justamente as que encontram maiores
dificuldades em se adaptar devido às condições financeiras restritivas.
AMBIENTES SEGUROS
Aumentar a segurança do trabalho é mais do que desejável – é
um dos principais objetivos da
indústria. Para além da evidente questão ética que envolve a
segurança, empresas com elevados índices de acidentes pagam caro tanto em
termos materiais – planos e seguros de saúde, previdência social, processos
judiciais – quanto em relação à sua imagem pública. Além disso, um ambiente de
trabalho saudável e seguro é mais produtivo e ajuda a reter os melhores
profissionais, o que é de alto interesse das empresas. Em sua essência a NR-12
vai ao encontro desses objetivos, mas ela peca na forma. É comparável ao
remédio que, ministrado em dose excessiva, acaba matando o paciente. “A norma
não é razoável. Não tem como ser aplicada do jeito como está formulada, pois
exige a modificação de todo o parque fabril. É necessária uma revisão”, diz
Carlos Kurtz, diretor jurídico da FIESC.
A proposta de revisão da norma compreende a ideia de migrar de
ambientes de trabalho seguros para ambientes ainda mais seguros. Nas empresas
com bom histórico de segurança não há por que impor alterações no que já
funciona bem, devendo-se limitar as mudanças às novas instalações e
equipamentos. Trata-se do estabelecimento de uma linha de corte temporal de
obrigações para as máquinas usadas e novas.
A proposta da indústria abrange ainda novos prazos para
adequação e o estabelecimento de exigências diferenciadas para fabricantes,
dentre outros aspectos (veja o quadro). Também é importante a incorporação de
medidas de treinamento e conscientização dos funcionários atingidos pelas
normas.
Ajustes na NR-12 têm sido discutidos em audiências públicas
promovidas pelo MTE e também pela Secretaria da Micro e Pequena Empresa, Congresso
Nacional e outras instâncias. A mobilização do setor industrial é intensa. “A
situação a que chegamos demonstra a importância da união entre as entidades
representativas (CNI/FIESC) e o setor industrial na defesa de melhores
condições para produzir e gerar empregos. Os avanços sempre são resultados
dessa união”, diz Glauco José Côrte, presidente da FIESC.
Fonte: FIESC –Indústria & Competitividade – Março de 2014
Comentário:
A origem fail-safe é
para sistema de alto risco ou com probabilidade de desencadear por efeito dominó
um desastre. Isso é muito compreensível em energia nuclear, petroquímica, prospecção de petróleo, aeronáutica,
transporte (metrô, trem).etc.
O conceito de falha segura (fail-safe) está intimamente
ligado ao projeto e design da máquina, equipamento ou linha de processo. Não é
um acessório de segurança.
Quando se quer incorporar o sistema de fail-safe em máquinas
ou equipamentos usados o projeto poderá
sair mais caro do que um equipamento novo ou se tornar inviável a colocação de
dispositivo. (equipamento ou máquina obsoleto).
Seria a mesma coisa o governo obrigar a todos os proprietários
de veículos a colocar airbag frontal (motorista e acompanhante) e freio ABS em
os todos veículos usados, semi-novos, etc. O custo poderia ser superior ao
carro ou inviável por obsoletismo do carro.
A norma não faz distinção entre empresas; grande, micro e
pequena.
O governo deveria incentivar a modernização das indústrias
com máquinas novas e mais modernas com dispositivos de segurança, inclusive com
juros subsidiados, reduzindo os impostos, etc. Os fabricantes seriam
responsáveis pelo recolhimento de máquinas velhas e obsoletas, sem dispositivos
de segurança. O que acontece atualmente as máquinas obsoletas vão para o
mercado de maquinas usadas transferindo o problema para o empresário,
principalmente para o pequeno
empresário, que não tem um serviço especializado de segurança.
O que temos na maioria das empresas máquinas novas com
projeto obsoleto e parque industrial com máquinas sucateadas e sem proteções.
Estimativa de custos na aplicação da NR-12
■Assessoria na implantação da Norma, em média, acima de R$
5.000,00 por máquina;
■Custo de adequação de máquinas e processos simples, com
proteções fixas e móveis intertravadas e com parada de emergência, monitorados
por relé de segurança, entre R$ 9.000,00 e 16.000,00, em média;
■Custo de adequação de máquinas maiores, com construção de
grades e proteções, além das medidas das máquinas menores, entre R$ 50.000,00 e
R$ 150.000,00, em média;
■Custo de descaracterização e descarte de R$ 1.000,00 por
máquina.
PARQUE INDUSTRIAL BRASILEIRO
É considerado micro empresa com faturamento bruto de 360 mil
reais/ano e empresa de pequeno porte com faturamento na faixa de 360 mil a 3,6 milhões de reais/ano.
No Brasil predominam as micro e pequenas empresas. De acordo
com dados do Sebrae, quase 98% das empresas são micro e pequenas empresas. A maioria
não necessita de serviço especializado em segurança do trabalho.
■São quase 880 mil
empresas (micro e pequena) .
Por exemplo; na atividade de metais e máquinas temos 69 mil
empresas.
■São quase 12 mil empresas médias e grandes
Por exemplo; Na atividade de metais e máquinas temos 1.494
empresas.
Na atividade de padaria e confeitaria temos 63 mil
estabelecimentos.
Como solucionar os problemas de segurança para as micro e
pequenas empresas numa norma tão complexa, como é a NR-12? No Brasil a política
de segurança do trabalho não diferencia uma empresa com 10 trabalhadores, com
outra que tem cinco mil trabalhadores. Nos países em que predominam a cultura
de prevenção existe essa diferenciação, chegando ao ponto que as agência
assessoram essas empresas.
CONCLUSÃO: Numa análise mais abrangente a prevenção de
acidentes do trabalho interage com que tipo de política industrial adotado no
país quanto a tecnologia segura utilizado em máquinas e equipamentos. Não dá
para organizar uma indústria num Manual de Normas de Segurança.
Desde a criação da Portaria 3214 em 1978, o governo está
preocupado com a implantação das normas do ambiente de trabalho. A norma nada
mais é uma diretriz que deve seguir todas as empresas após o levantamento dos
riscos existentes na empresa. O grande erro cometido e está cometendo o órgão do governo, parte do principio que com a implantação das
normas no ambiente de trabalho os acidentes estão controlados, esquecendo que
as normas são dispositivos/exigências estáticas, enquanto os riscos são
dinâmicos. Os riscos associam-se em cada
ambiente de trabalho de maneira diferente, adaptando-se as condições locais. Os
riscos são nada mais do que “vírus mutantes” adaptam-se as circunstâncias existentes nos locais trabalho ou máquinas,
equipamentos, trabalhadores. Quando o órgão do governo exige a implantação das
normas no ambiente de trabalho, os
responsáveis irão preencher os quesitos desses programas conforme as diretrizes
e apenas pensando nos riscos no desenrolar das exigências desses programas. O
que resulta as empresas estão preocupadas com as normas, esquecendo a prevenção
de riscos ou de fixar uma política de segurança voltada para controle de
riscos. Quando o enfoque é a norma, ela
induz o profissional analisar o problema da adaptabilidade do risco em relação
à norma? Não ao contrário, o risco exige uma análise detalhada e é peculiar.
Somente através da implantação de uma política
prevencionista, em que a norma é discutida sobre os aspectos estáticos
(requisitos) e aspectos dinâmicos (peculiaridade do risco) onde a exigência de
proteção ao risco, poderá estar acima da exigência da norma padrão.
