Combinando dados
históricos com estudos sismológicos, trezentos anos de uma informação
adormecida emergem como fonte do maior evento sísmico conhecido que atingiu o
Brasil desde nossa colonização. O provável epicentro do tremor de 1690 foi na
margem esquerda do Rio Amazonas, aproximadamente 45 km abaixo da hoje moderna
Manaus. Um ano depois, quando passava pela área epicentral, um missionário
encontrou testemunhas do tremor e observou marcantes modificações na topografia
e na vegetação ao longo da margem do rio. Em 1692, outro padre confirmou a
ocorrência do tremor e foi informado de que surgiram grandes ondas no rio que
inundaram aldeias indígenas. A violência do terremoto espalhou ondas sísmicas
pela floresta e balançou construções indígenas a mais de mil quilômetros de
distância. O cálculo dos parâmetros sísmicos indicou uma magnitude estimada de
7, intensidade sísmica de IXMM e área de percepção de 2 milhões de km2.
A descoberta de um terremoto deste tipo, caracterizado por longo período de
recorrência, é de grande importância para estudos de sismicidade intraplaca.
Para o Brasil ele desfaz o mito de que nosso país nunca foi afetado por
terremotos severos. Estudo publicado
pelo geólogo Alberto Veloso, um dos criadores do Observatório Sismológico da
UnB (Universidade de Brasília), artigo publicado pela revista Academia Brasileira de Ciências de setembro de
2014.
Árvores lançadas ao rio, desmoronamento de terra, matas
devastadas e pequenos tsunamis. O terremoto descrito por um padre missionário
que percorreu a Amazônia no século 17 foi agora comprovado cientificamente e
pode mudar a literatura sismológica do país.
O maior terremoto já ocorrido no Brasil aconteceu em 1690, a
45 km de Manaus, às margens do rio Amazonas.
Com base no relato de dois padres jesuítas que atuavam na
região, o geólogo Alberto Veloso calculou a magnitude e amplitude do sismo: 7
graus na escala Richter, similar ao que matou 300 mil pessoas no Haiti em 2010.
A DESCOBERTA
Associando relatos históricos com estudos sismológicos
modernos trazemos à tona informações inéditas sobre o maior terremoto conhecido
no Brasil. Com magnitude estimada 7 (M7), intensidade sísmica IX-MM e área de
percepção em torno de 2 milhões de km2.
Seu provável epicentro localizou-se na margem esquerda do
Rio Amazonas, entre o afluente Jatuarana e o Rio Preto da Eva, a cerca de 45 km a jusante de Manaus, na época era
um vilarejo.
Essa estimativa coloca o terremoto da Amazônia à frente do
sismo ocorrido em 1955 no Mato Grosso, o maior que já tinha sido registrado até
hoje no Brasil, com magnitude de 6,2.
RELATOS DOS TREMORES
Em seu diário, o padre tcheco Samuel Fritz, que catequizou
índios na Amazônia por 40 anos, descreve a destruição do local um ano após o
tremor, e colhe depoimentos de índios que relataram os tremores –e apontaram o
missionário como culpado pela fúria da natureza.
Veloso teve acesso às memórias de um segundo catequizador, o
padre Felipe Bettendorf, que também descreveu relatos de indígenas no local,
dois anos após o fato.
"São escritos confiáveis e muito consideráveis, eles
tratavam as coisas com os pés no chão", conta.
O pesquisador mapeou os pontos em que os padres relataram o
que viram, mais os locais onde os relatos dos índios que sentiram o tremor
foram colhidos. Com isso, traçou o provável epicentro e a magnitude –uma
estimativa conservadora, segundo ele.
As descrições dos padres também ajudaram a detalhar os
efeitos do terremoto, como abertura de clareiras na mata, árvores tombadas e o
esfarelamento de rochas.
TRECHO DO DIÁRIO DO PADRE SAMUEL FRITZ:
A 6 pela manhã, surgiram ao lado Norte as terras em que, no
ano passado de 1690, pelo mês de junho, ocorreu um grandíssimo terremoto.
Pareciam ruínas de grandes cidades; penhascos caídos, árvores grossíssimas
desarraigadas e lançadas ao rio; terras muito altas desmoronadas; outras
brancas, vermelhas, amarelas, no meio de pedras e árvores, amontoadas sobre as
margens (..)
TSUNAMIS
O terremoto provocou ondas semelhantes a de tsunamis,
aldeias foram inundadas e o curso do rio Urubu, afluente do Amazonas, foi
invertido por um período. Não há relatos de vítimas.
"Hoje seria diferente, pois a região se desenvolveu e
há exposição de construções que não foram desenhadas para resistir a abalos
fortes", afirma o pesquisador, que esteve no epicentro, mas não encontrou
sinais do sismo.
"Cabe agora buscarmos vestígios que o terremoto deixa.
Requer um trabalho grande de escavação", diz Veloso.
Para Veloso, a descoberta desmistifica a máxima de que o
Brasil não pode ser atingido por grandes abalos sísmicos. "Aconteceu um,
pode acontecer outro. O período de retorno, porém, é grande, calculado em 500
anos", diz.
CONCLUSÃO
O tremor sacudiu o terreno de forma violenta e agitou
fortemente as águas dos rios da região. Na área epicentral o chão foi revirado,
partes subiram, outras desceram, encostas escorregaram, apareceram gretas,
lagoas secaram e outras nasceram do nada. Árvores tombaram abrindo clareiras na
mata e outras se amontoaram pelas margens do rio. Muitos desses efeitos se
devem ao fenômeno da liquefação (passagem do estado sólido para o líquido)
quando rochas saturadas de água perdem a rigidez pela intensa vibração sísmica.
As águas do Amazonas balançaram de forma incomum produzindo
ondas de porte com força para inverter a corrente do rio Urubu, ocasionando
inundação em aldeias indígenas a cerca de 5 km de sua foz com o Amazonas. Tais
ondas se assemelharam aos efeitos de um pequeno tsunami em pleno coração do
Brasil.
Não existe nada similar em nossa história e assim, esse
evento, percebido a mais de mil quilômetros do epicentro, ganha o status do
maior terremoto brasileiro. Mas tudo aconteceu em junho de 1690 num país em
formação e quando Manaus não passava de um ajuntamento de poucas cabanas
cobertas por palha. Tais relatos partiram dos padres jesuítas Samuel Fritz e
Felippe Betendorf, que visitaram em épocas distintas a região epicentral e
conversaram com testemunhas dos fatos.
BRASIL NÃO ESTÁ IMUNE A SISMOS DANOSOS
Que ensinamentos tirar do raro e perigoso tremor?
Primeiramente a de que o Brasil não está imune a sismos fortes e potencialmente
danosos. Há cerca de 300 anos não se falou de prejuízos materiais, ou de
vítimas fatais. Hoje não seria assim, pois aquela região desenvolveu e há maior
exposição de pessoas, de construções e de importantes infraestruturas que não
foram desenhadas para resistir a sismos fortes.
Um alerta! Tremores parecidos poderão repetir-se, não
somente na Amazônia, como em qualquer outra região brasileira.
Um terremoto como o de 1690 produz fortes acelerações no
terreno. O que esperar se acontecer próximo de uma cidade? No início a área
epicentral tremerá com violência por vários segundos e o local experimentará
danos generalizados. Estruturas bem edificadas poderão sofrer estragos
profundos e até colapsos parciais. Construções frágeis desabarão por completo,
outras serão deslocadas de suas fundações, barragens de pequeno porte poderão
romper, assim como tubulações subterrâneas facilitando a propagação de
incêndios. Certamente haverá pânico, serviços básicos serão interrompidos.
Pessoas cairão pelo chão, muita poeira se elevará dos desabamentos que
fatalmente atingirão moradores e o número de mortos poderá ser elevado. Com
menor intensidade isto poderá se repetir em localidades a dezenas de
quilômetros do epicentro.
Estima-se que um sismo M7 aconteça no Brasil a cada 500 anos
e um tremor M5 a cada cinco anos, aproximadamente. Mesmo estes abalos menores
podem fazer estragos em construções frágeis, comuns pelo país afora. Em 1986 um
abalo de 5.1 danificou cerca de 4.500 construções e desabrigou mais de 25 mil
pessoas em João Câmara, RN. Já tivemos tremores com M6.1 e M6.2 que só não
causaram danos importantes por terem seus epicentros em áreas despovoadas.
Terremotos se posicionam bem atrás de outros fenômenos
naturais que causam desastres no Brasil, como chuvas torrenciais, secas e
vendavais. Entretanto, os sismólogos tem a obrigação de fazer alertas como o de
agora, porque nossos sismos continuarão acontecendo e não se sabe exatamente
onde, quando e de que tamanho virão.
Fonte: Folha de São Paulo - 19/10/2014, On the footprints of
a major Brazilian Amazon earthquake, Alberto V. Veloso. Instituto de
Geociências, Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil.
Comentário: Em 1848, Manaus
tinha uma praça, dezesseis ruas, 243 casas e cerca de três mil
habitantes.
Segundo Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) de agosto de 2014, a cidade de Manaus tem uma população de 2.020.301 de habitantes, que faz a capital do Amazonas a 7ª mais
populosa do País. O Estado possui 62 municípios, com 3.873.743 habitantes.
Terremoto atinge o Amazonas
Um terremoto de magnitude 4,6 atingiu o Estado do Amazonas
na noite de terça-feira, 25 de novembro.
De acordo com o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS, sigla em inglês), o
tremor foi registrado na divisa com o Acre e na fronteira com o Peru. Não há
informações sobre vítimas ou danos materiais.
O tremor ocorreu às 21h26, no horário local (23h26 de
Brasília), com 562 km de profundidade e epicentro a 222 km da cidade de
Eirunepé, localizada a 1.159 km da capital, Manaus.O município fica próximo
também das cidades de Cruzeiro do Sul, Tarauacá e Feijó, todas no Acre.
O Comando de Policiamento do Interior do Amazonas (CPI) e a
delegacia de Eirunepé informaram que, até 23h50 (horário local), não tinham
informações sobre o sismo. Fonte:G1, em São Paulo-26/11/2014
Novo sistema integra monitoramento de terremotos no país
Entrou em operação a Rede Sismográfica Brasileira (REBR), um
serviço de monitoramento que recebe informações de mais de 80 estações
instaladas no país.
As informações ficam disponíveis no site www.rsbr.gov.br. A
Petrobras gastou R$ 25 milhões no programa, que integra serviços do
Observatório Nacional, da USP, da UFRN e da UNB.
As estações estão presentes em todo o território nacional,
porém mais concentradas no Sudeste e no litoral.
O Brasil sofre dois terremotos de magnitude mais elevada
(mais do que 6 graus na escala Richter) por século. O último foi em 1955. O
serviço ajudará a prever os fenômenos e evitar grandes catástrofes. Fonte: Folha
de São Paulo - 28 de novembro de 2014
Marcadores: terremoto