COMO AS CHUVAS SE TRANSFORMAM EM ENCHENTES
Não há dúvida de que a água
pode causar uma enorme destruição, como mostraram as recentes chuvas na Itália.
Mas como um elemento tão pacífico consegue desenvolver uma força tão
destruidora?
Como se fossem castelos de
cartas, casas inteiras desabaram ou foram arrastadas por um enorme volume de
água marrom nos últimos dias. Numa questão de minutos, as enchentes na Itália
varreram carros como se fossem de brinquedo e transformaram porões em
armadilhas mortais. Repetidas vezes, a natureza demonstra sua força
avassaladora e nada nos resta a fazer.
Mas como a água pode exercer
uma força tão poderosa? É exatamente esta pergunta que reponde Michael Dietze,
da Seção de Geomorfologia do Helmholtz Center Potsdam, no site do Centro Alemão
de Pesquisa em Geociências (GFZ).
UM METRO CÚBICO DE ÁGUA PESA
UMA TONELADA
O primeiro a se ter em mente,
diz Dietze, é que um metro cúbico de água pesa uma tonelada - um peso e tanto!
Isso significa que "a água pode exercer uma pressão enorme sobre um objeto
em seu caminho. E quando em movimento, a água é imensamente poderosa - tão
poderosa que é capaz de varrer carros ou até mesmo contêineres que não
estiverem ancorados no chão".
Mas outros fatores também
entram em jogo, incluindo a erosão. Superfícies degradadas, ainda que aparentemente
estáveis, podem ser facilmente varridas pelas cheias.
No GFZ de Potsdam, os
pesquisadores estudam exatamente como a água mobiliza sedimentos, como as ondas
de inundação viajam e como as poderosas enchentes varrem as paisagens.
Chuvas fortes estão entre os
perigos mais subestimados, adverte o Serviço Meteorológico Alemão (DWD), pois
são difíceis de prever e raramente estão associadas a uma localização
específica. Embora possam prever a região, os meteorologistas não são capazes
de antecipar exatamente quando ou quanto choverá num determinado local.
Como resultado, fortes chuvas
podem causar mais danos do que o esperado, mesmo em lugares que não estão
situados em vales estreitos ou perto de grandes rios. "As fortes
precipitações despejam uma quantidade tão grande de água no solo, muitas vezes
já saturado pelas chuvas anteriores, que ele não é capaz de escoar mais
nada", explica o geomorfólogo Dietze.
DIFERENTES TIPOS DE SOLO
ABSORVEM A ÁGUA DE MANEIRA DIFERENTE
O volume de água não é o único fator. A composição do solo, ou melhor, sua capacidade de absorver, armazenar e escoar água, também desempenha um papel importante.
É aqui que entra em jogo o
tamanho dos poros das partículas do solo. "Colóides" são partículas
minúsculas medindo menos de 2 micrômetros de largura - pequenas demais para
serem visíveis a olho nu. Mas em grandes quantidades, justamente por terem
dimensões minúsculas, elas fornecem uma imensa área de superfície onde as
moléculas de água podem se ligar.
Os solos argilosos e arenosos
contêm muitos desses colóides, nos quais a chamada "água
intersticial" é retida e não consegue escorrer. Tais solos contêm poucos
poros e, portanto, uma vez devidamente saturados, podem reter mais água do que
areia.
Os grãos de areia, por sua
vez, são maiores, com bem mais poros grandes e cheios de ar e apenas um pequeno
número de colóides. No solo arenoso, a água mal pode ser retida e acaba
escoando rapidamente.
Outra questão crucial é a
condição do solo antes da chuva. No caso de uma chuva repentina e forte após um
período prolongado de seca, o solo não consegue absorver a água de uma só vez.
O solo seco tem o que é chamado de "repelência à água", o que
significa que, em vez de escoar, a água flui pela superfície. Resíduos vegetais
também são um fator, pois liberam gorduras e substâncias cerosas durante
condições secas.
A ÁGUA FORJA SEU PRÓPRIO
CAMINHO
Quando o solo fica saturado
após longos períodos de chuva, a água não tem outra escolha a não ser escorrer
pela superfície até desaguar nos córregos e rios.
"Uma vez chegando lá,
ela pode atingir velocidades muito altas", disse Dietze. Na estação de
pesquisa ecológica da Universidade de Colônia, que fica às margens do rio Reno,
por exemplo, a água flui normalmente a uma velocidade de 1 a 2 metros por segundo.
"Quanto maior a
velocidade e a inclinação - especialmente em taludes e cumes - e quanto mais
profundo o rio, mais força a água poderá captar no leito fluvial. Sua força é
equivalente a vários quilos, o que é suficiente para varrer areia, pedras e até
detritos", explicou Dietze.
ÁGUA E PARTÍCULAS: UMA
COMBINAÇÃO FATAL
Mas isso, por si só, não é
suficiente para arrasar casas e ruas. Por trás disso estão também as partículas
que são carregadas junto com a água. Elas penetram no solo, nas ruas e nas paredes
das casas, desenvolvendo um enorme poder de erosão.
"Uma vez que partes
desses objetos começam a ser atacadas, o material por baixo é carregado mais
facilmente", explicou Dietze, acrescentando que ruas e prédios em terreno
não consolidado também podem ser danificados, facilitando a quebra de mais
material.
"Essa combinação de
material sendo arrastado com o poder de simplesmente carregar ainda mais
material solto dá à água em rápido movimento o poder de causar danos enormes
num curto espaço de tempo", acrescentou.
Ele enfatizou ainda que tais
inundações podem se desenvolver em qualquer lugar onde ocorram chuvas fortes.
Segundo Dietze, a precipitação extrema é especialmente perigosa em áreas altas
e montanhosas, onde o eventual rompimento repentino de barragens pode causar o
transbordamento de lagos inteiros, ou onde grandes quantidades de gelo
derretido podem desencadear deslizamentos de terra e ondas de inundação nos
vales logo abaixo.
AS INUNDAÇÕES PODEM SER
PREVISTAS?
"Avisos meteorológicos
podem ser derivados de previsões", disse Dietze. "Por exemplo, as
previsões meteorológicas podem ser alimentadas em modelos hidrológicos, para
poder fazer previsões sobre a probabilidade e o desenvolvimento de
inundações."
Por outro lado, o processo de
erosão é mais difícil de prever. Como tais eventos acontecem muito rapidamente,
sua intensidade é difícil de medir com precisão.
Com a ajuda de imagens de satélite e, principalmente, de sismômetros, os pesquisadores passaram os últimos anos tentando acompanhar as ondas de inundação em tempo real e calcular sua intensidade. As pesquisas ainda se encontram nos estágios iniciais, enfatizou Dietze, mas têm um imenso potencial quando se trata de sistemas de alerta precoce de inundações. Fonte: Deutsche Welle – 22.05.2023
Marcadores: alagamento, enchente
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