Mortes por raios no Brasil
São Paulo lidera o número de mortes por raios entre os
estados da federação, seguido por Rio Grande do Sul e Minas Gerais. No Brasil
ocorrem 132 mortes por ano devido a descargas elétricas atmosféricas, os raios,
o que nos coloca na quinta posição de fatalidade entre os países com
estatísticas confiáveis. E a probabilidade de um homem ser atingido por uma
dessas descargas, curiosamente, é dez vezes maior que a de uma mulher. Além
disso, a probabilidade de ser vítima de um raio na fase adulta é o dobro da
representada tanto por jovens quanto idosos. Viver na zona rural ou urbana
também altera essas chances. Na área rural, a probabilidade de receber uma
descarga é dez vezes maior.
Esses são alguns dos resultados do levantamento de mortes
por raios da década – dados de 2000 a 2009 – elaborado pelo Grupo de
Eletricidade Atmosférica (Elat) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe). O estudo reuniu pela primeira vez informações de diversos órgãos
brasileiros como Elat/Inpe do Ministério da Ciência e Tecnologia, Departamento
de Informações e Análise Epidemiológica (CGIAE) do Ministério da Saúde, Defesa
Civil, veículos de imprensa e dados de população do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE).
O Brasil é um dos poucos países que dispõe de um mapeamento
detalhado das circunstâncias das mortes por descargas elétricas atmosféricas, o
que pode contribuir significativamente para aperfeiçoar as regras nacionais de
proteção contra o fenômeno. Nos Estados Unidos, a circunstância que mais
provoca mortes por raios são as atividades esportivas ou de recreação, como
pescar, acampar e jogar golfe, diferentemente do Brasil. Uma análise
sociológica permite deduzir que essa diferença está atrelada principalmente ao
fato de os Estados Unidos serem um país desenvolvido e o Brasil estar ainda em
desenvolvimento. Assim, atentar para a proteção de pessoas jogando golfe não
seria a melhor forma de fazer uma
campanha de proteção nacional. O ideal é instruir a população a não realizar
atividades agropecuárias (causa principal das fatalidades no Brasil), assim
como orientar as pessoas a não permanecerem próximas aos meios de transporte,
sob árvores e em campo de futebol durante as tempestades. Outras circunstâncias
também apresentam percentuais comparativos distintos no Brasil e Estados
Unidos.
Na década passada, no Brasil, morreram 1.321 pessoas
atingidas por raios, número muito acima das estimativas disponíveis antes do
estudo (as menos conservadoras indicavam cerca de 100 mortes). O que essas
vítimas tinham em comum eram as atividades que praticavam quando foram
atingidas pelas descargas. Exatos 19% das vítimas eram trabalhadores rurais que
recolhiam animais ou se ocupavam de plantações com enxadas, pás e facões. A
segunda circunstância mais comum foi estarem próximas aos meios de transportes
(14%), cujas estruturas metálicas elevam a chance de receber descarga. Aqui
convém ressaltar que refugiar-se no interior de um veículo, como um automóvel
ou avião, é seguro. A sorte de um piloto e seu copiloto em 2008, no interior de
São Paulo, poderia ter sido diferente se eles tivessem seguido essa
recomendação. Ambos perceberam a aproximação de uma tempestade com o avião
pousado em uma fazenda e buscaram abrigo sob uma das asas e morreram atingidos
por um raio.
USO DE TELEFONE
Permanecer no interior de uma casa sem os devidos cuidados
também foi causa de mortes (14%) na última década. O estudo revela uma
conclusão interessante. Apesar de 85% das mortes terem ocorrido ao ar livre
quando esses dados são relacionados a diferentes circunstâncias, a porcentagem
em cada uma delas é próxima à categoria “dentro de casa”. Esse fato revela que
permanecer dentro de casa não é tão seguro quanto se pensava.
A maioria das vítimas atingidas por raios em domicílios;
■estava falando ao telefone com fio,
■descalça em casa com chão de terra batida ou ainda próxima
a antenas,
■lâmpadas,
■geladeiras,
■janelas e televisores.
A categoria “sob árvore” ficou em terceiro lugar com 12%,
seguida por “campo de futebol”, com 10%.
O estudo traz outro resultado interessante, evidenciando que
as circunstâncias em que ocorrem mortes por raios apresentam variações
significativas em diferentes regiões do Brasil.
REGIÔES
É possível perceber que características de determinadas
regiões ficam evidentes nos percentuais das mortes por raios. A atividade
agropecuária, por exemplo, atinge o maior percentual na região Sul, a mais
tradicional do país nessa área. Já as regiões Norte e Nordeste apresentam os
percentuais mais altos para a circunstância dentro de casa, provavelmente
indicando que muitas casas nessa região são de chão de terra batida, que as
torna muito menos seguras. Outros dois dados que chamam a atenção são: o índice
de 20% de mortes devido à circunstância “telefone” (telefone com fio ou celular
conectado ao carregador) no Centro-Oeste, que é quase nulo em outras regiões, e
o percentual de mortes no Norte “em campos de futebol”, também alto quando
comparado a outras regiões.
MORTES
As mortes por ano sofreram variações significativas na
última década. Os valores máximos ocorreram em 2001 e 2008, coincidentemente em
anos associados ao La Niña, fenômeno oceânico-atmosférico caracterizado por um
esfriamento anormal das águas superficiais do oceano Pacífico equatorial. Essa
associação, no entanto, merece ser mais investigada nas próximas décadas.
Considerando a população média durante esse período (180
milhões), a probabilidade também média de morrer atingido por um raio é de 0,8
por milhão por ano. Esse índice está entre os valores estimados para os países
desenvolvidos (cerca de 0,3 morte por milhão por ano) e os países em
desenvolvimento ou subdesenvolvidos (6 mortes por milhão por ano). Essa
probabilidade, entretanto, é uma média e não corresponde à chance de uma pessoa
morrer atingida por um raio em dada circunstância., Se uma pessoa está ao ar
livre durante uma forte tempestade, por exemplo, esta probabilidade pode ser da
ordem de um para mil em vez de um para milhão. Na Austrália, a probabilidade de
morte por raio é igual à do Brasil, com base em dados de 1980-1989. Já nos
Estados Unidos, a probabilidade é muito menor – 0,2 por milhão por ano – com
base em dados de 2000-2006.
■O Sudeste, no Brasil, foi a região onde mais pessoas
morreram (29% do total),
■ As demais regiões praticamente empatadas: Centro-Oeste
(19%), Norte (18%), Nordeste (18%) e Sul (17%).
Considerando a população de cada região, a probabilidade de
morte por raio varia de 0,5 a 2,2 por milhão por ano.
ESTAÇÕES DO ANO
Em termos de estações do ano, a maior parte das mortes
ocorreu no verão.
■ 77% das mortes se deram no verão e na primavera, períodos
do ano em que se registrou cerca de 80% dos raios no Brasil.
Do total de mortes na década, 81% foram homens e 19%
mulheres. A faixa etária com maior número de mortes vai dos 20 aos 39 anos
(43%), seguida pelo grupo de 0 a 19 anos, com 27%. Nos Estados Unidos, as
porcentagens de mortes por raios em homens e mulheres são semelhantes às do
Brasil: 82% são homens e 18% mulheres. Quando os dados são distribuídos nas
diferentes faixas etárias, os valores encontrados para os Estados Unidos também
são próximos aos do Brasil.
OCORRÊNCIA DAS MORTES
■ A maior parte das mortes no Brasil ocorreu na zona rural
(61%),
■ 26% na zona urbana,
■ 8% no litoral e
■ 5% em rodovias.
Considerando a população urbana e rural, a probabilidade de
morte por raio no meio rural (0,7 por milhão por ano) é dez vezes maior que na
zona urbana (0,07 por milhão por ano).
ESTADOS
Em termos de estados, São Paulo foi a unidade da federação
com maior número de mortes (230), 17% do total, seguido pelo Rio Grande do Sul
(106), Minas Gerais (99), Mato Grosso do Sul (89) e Goiás (80). Já a
probabilidade mais alta de morte por raio considerando as respectivas
populações está no estado do Tocantins (4,6 por milhão por ano), seguida por
Mato Grosso do Sul (4,3 por milhão por ano). As menores probabilidades estão na
Paraíba e Sergipe (0,1 por milhão por ano), desconsiderando o Amapá, onde não
houve registros de mortes. No estado de São Paulo, a probabilidade de morrer
atingido por raio é de 0,6 por milhão por ano. Nos Estados Unidos, o estado com
maior número de fatalidades por raios é a Flórida, com uma média de 12,6 mortes
por ano (período de 1990 a 2003) e a probabilidade de morrer atingido por raio
é de 0,8 por milhão por ano.
INCIDÊNCIA DE RAIOS
A incidência média de raios por ano no Brasil na última
década foi de cerca de 57 milhões. O estado do Amazonas registrou o maior
valor, com cerca de 11 milhões de raios. São Paulo registrou cerca de 2,3
milhões de raios por ano. Em relação a municípios, Manaus apresentou o maior
número de fatalidades (16 casos), seguido por São Paulo com (14). O número de
fatalidades não corresponde diretamente ao valor anual da incidência de raios
no Brasil ponderado pela população de cada estado. Isso sugere que outros
fatores, além da incidência de raios, devem ser considerados.
Alguns desses fatores provavelmente são as diferentes
proporções da população urbana e rural em cada estado, devido à diferença da
probabilidade de morrer atingido nas áreas rurais e urbanas, e também pelos
hábitos de vida da população, distintos em cada região do país. Outro fator
relevante é o fato de que as mortes por raios diminuem quando a população se
torna mais ciente dos riscos. Fonte: Scientific American Brasil – 27 de julho
de 2011

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