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sexta-feira, agosto 29, 2014

NBR e o Ato Inseguro

Interessante está circulando em alguns fóruns de segurança na internet, abaixo assinado,  para eliminação do Ato Inseguro, agora na NBR da ABNT, parece que o famigerado  termo politicamente correto já se infiltrou na segurança do trabalho.
Temos de perguntar ao finado trabalhador que termo ele prefere, ato inseguro ou comportamento inseguro ou  falhas ativas ou erros, etc.?
Através da Portaria n° 84/09, o Ministério do Trabalho corrigiu um antigo erro. A expressão “ato inseguro”, contida na alínea “b” do item 1.7 da NR 1, foi retirada da regulamentação, assim como os demais subitens que atribuíam ao trabalhador a culpa pelo acidente de trabalho. Por acaso houve redução dos acidentes pertinentes as falhas humanas?
 Como explica o abaixo assinado; Em 2009, após muitas críticas, debates, protestos e lutas de trabalhadores, o Ministério do Trabalho e Emprego finalmente retirou da legislação de Saúde e Segurança do Trabalho esta que era uma das mais típicas figuras do entulho autoritário: o “Ato Inseguro”. Desde quando o ato inseguro é um entulho autoritário? Deve ser o modismo de engenharia social? Parece que a engenharia no Brasil deixou de ser safe, safety, human engineer, para ser social e preocupar apenas com glossário técnico ou social.
Devemos eliminar também os termos;
1) negligência: desleixo, descuido, desatenção, menosprezo, indolência, omissão ou inobservância do dever, em realizar determinado procedimento, com as precauções necessárias;
2) imperícia: falta de técnica necessária para realização de certa atividade;
3) imprudência: falta de cautela, de cuidado, é mais que falta de atenção, é a imprevidência a cerca do mal, que se deveria prever, porém, não previu.
Enquanto isso no Brasil real, os acidentes acontecem e estão acontecendo enquanto redijo. Daqui a pouco não existe mais pobre no país, tudo mundo é da classe média? Ou a classe média se tornará a pobreza latente? Talvez com a eliminação do Ato Inseguro, acontecerá a mesma coisa, a causa mortis do trabalhador não terá no atestado o entulho autoritário do Ato Inseguro.
“No creo en brujas, pero que las hay, las hay”
Por que esses grupos que estão tão preocupados com a prevenção dos trabalhadores não retiram da NR e CLT os dinosssauros dos adicionais ; periculosidade, insalubridade, etc.  Não existem esses adicionais em país civilizados que praticam a prevenção de riscos. Esses adicionais se tornaram monetização do risco a saúde do trabalhador. É muito pior do que o entulho do Ato Inseguro.
Por acaso sabemos os custos de acidentes por atividades ou ocupações das empresas no país?
Quais são os acidentes mais comuns por ramo de atividade?
Se o profissional quiser aprofundar na área de segurança temos consultar bibliografias estrangeiras, sites, etc. Para obter dados e tentar adaptar a realidade brasileira.
Que tal se preocupar com o nível de escolaridade do trabalhador brasileiro? A maioria tem  menos de 8 anos de estudo.

Alguns comentários que já fiz em alguns fóruns sobre o assunto:

ATO INSEGURO: DEMONIZAR OU EXORCIZAR
Esse problema de ato inseguro em que alguns querem  demonizar ou exorcizar , lembra na década de 80, o método Taylor. O método de Taylor é apenas lembrado como  aumentar carga de trabalho do operário, pois o método através de medições de tempos aferia o tempo gasto por determinado tipo de tarefa. Mas essa aferição fazia parte de um trabalho mais amplo, a organização de tarefa e planejamento de produção. Como fazer um trabalho de modo quase perfeito sem perda de tempo. Mas ele é apenas  lembrado como carrasco do operário. Hoje na área de segurança a ordem de serviço ou um manual técnico, nada mais do que o método do Taylor, como fazer de modo à tarefa  com eficiência sem interrupção no sistema (acidente/falha). Em todas as atividades usamos a essência  do método de Taylor sem saber. Hoje o esporte utiliza esse método de forma mais avançado, através de filmagem fotograma por fotograma, é analisada a performance do esportista, passo a passo, como ele pisa, como respira, etc., para aumentar o seu desempenho   
Com o ato inseguro acontece à mesma coisa, o pessoal analisa o ato em si, mas sem levar em conta os fatores relacionados ao elemento humano que convergem para produzir o ato inseguro. Para estudar o acidente, temos duas vertentes o ato inseguro e condições inseguras. Voltamos a essência do método de Taylor, se fracionarmos todas as etapas que dão origem à falhas humana, podemos estudá-la  com mais detalhe e atuar onde  a probabilidade de ocorrer uma falha no sistema ou anomalia é mais freqüente. Os fatores/erros relacionados ao elemento  humano são semelhantes a quaisquer tipos de atividade.
Hoje, com os avanços no conhecimento e na tecnologia aumentaram consideravelmente  a complexidade de sistema. Devido sua combinação singular de processos, interações tecnológica e humana,  surgem também riscos inevitáveis, que às vezes, alguma coisa sairá errado. E uma das coisas mais difíceis é mudar o comportamento do elemento humano, pois não é padronizado, ao contrário das máquinas em que podemos alterar o ritmo de produção e  de segurança.
Uma visão interessante da causa de acidente utilizado por especialistas  no campo  aeronáutica e  nuclear é o modelo do queijo suíço (cheio de buraco).   A condição ideal  é separar o perigo da perda potencial, mas na prática parece mais como fatias de queijo suíço. As lacunas estão abrindo e fechando continuamente (sistema de defesa), ao mesmo tempo mudando de posição. O perigo sério aumenta quando um conjunto de linhas de buracos permite uma abertura  momentânea de oportunidade para o acidente. Aí estão as falhas ativas e latentes. Para isso devemos criar barreiras de segurança e de proteção.
O sistema de segurança ideal seria como o processador de texto Word, se erramos a palavra ele corrige,  se esquecemos de salvar, ele avisa, antes acontecer o desastre, perder o que está sendo digitado. Por causa disso algumas atividades o robô está substituindo o elemento humano.
 O que é comum na maioria das organizações quando ocorre uma falha no sistema, por exemplo, acidente ou falha de projeto ou falha no atendimento, é procurar um culpado e não analisar qual foi motivo dessa falha no subsistema. No Brasil é comum procurar/apontar um culpado do que ir a fundo qual a origem dessa falha. O erro não está no ato inseguro,  mas quem está interpretando a falha.
“Os fatos não falam, eles precisam ser interpretados por alguém. Tudo que é observado é modificado pela presença  do observador. Os fatos mudam a depender de quem está interpretando”.(Principio de Incerteza de Heisenberg).

AGÊNCIA  DE SAÚDE DA INGLATERRA ELABOROU UM ESTUDO SOBRE A FALHA HUMANA
A Agência  de Saúde da Inglaterra elaborou um estudo sobre a falha humana, reuniu diversos especialistas e elaboraram um manual sobre falha humana no ambiente hospitalar, mas no primeiro capitulo trata a análise  de falha humana de maneira genérica empregando termos de engenharia de segurança e comportamental. A conclusão que eles chegaram que o erro humano é inerente ao ser humano. Só através  de criação de barreiras de segurança (projeto, treinamento) poderá reduzir. Não existe  controle absoluto sobre o risco. Podemos ter percepção que estamos controlando o risco, mas outro riscos latentes estão aguardando  condições para transformar em acidentes.
Quando analisamos acidentes/incidentes em relação a fatores humanos procuramos relacionar os procedimentos padrões para determinadas tarefas e o seu grau de treinamento.
Porém esquecemos de analisar o comportamento mental do indivíduo. O nosso cérebro cria armadilhas para o ser humano que dificilmente o eliminamos, apesar  de efetuar um  treinamento exaustivo. Existe um frase em espanhol, que diz; Quando tínhamos todas as respostas, mudaram as perguntas. O cérebro está sempre nessa atividade de retroalimentação  de informações. O exemplo mais marcante é o treinamento de piloto de aeronave, constantemente eles recebem treinamento em simuladores de vôo,  mas nos acidentes aéreos ainda predominam a falha humana.
Alguns neuro-cientistas  consideram que o cérebro seja um sistema dinâmico não linear sujeito ao caos imprevisível.   
Por exemplo, troquei a minha senha na semana retrasada, eu me condiciono a não errar a nova senha, mas  por experiência, durante uma semana,  ora uso a  senha antiga, ora a nova senha, meu consciente cria uma armadilha para eu errar (depende também do ser humano).
Agora mesmo na Alemanha houve um acidente ferroviário, um trem de suspensão magnética de alta velocidade conhecido como Transrapid colidiu a 200 km/h contra um veículo de manutenção em Emsland, norte da Alemanha, matando 23 pessoas. O  trem e o veiculo de manutenção estavam na mesma linha. O veiculo de manutenção estava parado. Os especialistas indagam, como pode ter acontecido isso? O trem não tem operador é controlado  pela central de operação. Tira um elemento humano da cabine do trem para evitar erros, mas a central de operação cometeu a falha. Você pensa  eliminar o risco mas cria outro risco latente ou não que irá provocar a falha.
Temos ter consciência que a falha humana estará sempre presente na atividade e ela surgirá quando alguns eventos não previstos e fatores adversos se convergem num determinado momento para provocar o acidente. Não devemos esquecer que as normas de segurança são genéricas e estáticas e são modificadas de acordo com resultados obtidos na prática, enquanto o risco é como um vírus sempre está em mutação, isto é, se adapta ao ambiente e  estará sempre em processo de transformação.     

NÃO EXISTE FALHA HUMANA?.
O ato inseguro se procurarmos o significado do ato no dicionário, temos;  procedimento, conduta, modo de proceder, etc.
Veja o caso da memória, segundo especialistas (neurocientistas; quem nunca passou por um lapso de memória, não ficou um certo tempo tentando encontrar no seu acervo lingüístico pessoal, a palavra adequada para o contexto desejado, ou simplesmente não esqueceu o que iria dizer ao seu interlocutor? E quem nunca se esqueceu, em determinado momento, do que iria fazer logo em seguida?  Imagina se não treinarmos a memória para termos procedimentos para execução de determinada tarefa , o que seria ? Em atividade de baixo risco tecnológico a falha humana não é muito perceptível, mas a atividade de alto risco tecnológico a falha humana é extremamente perceptível (medicina, aviação, usina nuclear, hidroelétricas, etc). Onde o elemento humano toma decisão/interpretação diante de informações processadas por máquinas/computadores.   
O elemento humano é cheio de vícios, particularidades de essência de cada pessoa. Têm  pessoas metódicas,  outras indisciplinadas, outras têm dificuldade de assimilação de programas,  outras contrárias  a modificação de procedimentos, etc. Junta tudo isso, temos uma empresa com um ativo intelectual disperso, que através de treinamento, disciplina procuramos homogeneizar  esse pensamento voltada para os objetivos da empresa. Que é extremamente difícil, pois a cada empresa tem sua cultura/vícios.   
Veja o caso de um  bebê está aprendendo a engatinhar, tudo para ele é novidade, é o Indiana Jones a procura de aventura e perigo. São os pais que vão emitir verbalmente um Procedimento Seguro (PS)  para o bebê, o que é proibido ou não,   utilizar um DPI (dispositivo de proteção individual) ou um EPC (equipamento de proteção coletiva para residência) ou delimitar uma área para brincar (zona de risco). Apesar de todo esse treinamento dado pelos pais, sempre tem algum bebê que avança o sinal ou quebra o procedimento dado pelos pais, e aí acontece o acidente.   
Na essência o erro humano acompanha o ser humano em todas atividades. Alguns erros conseguimos corrigir, criamos outros erros latentes, mas a falha está sempre a favor da natureza. 

ATO INSEGURO FAZ PARTE DE UM SISTEMA OU SUBSISTEMA
O ato inseguro faz parte de um sistema ou subsistema de procedimentos ou componentes inter relacionados  que atuam e interagem com outros sistemas/subsistemas para cumprir uma tarefa ou função. O ato inseguro é o resultado processado de diversos fatores que envolvem o elemento humano.
Na análise de acidentes, na entrada, temos diversas dúvidas, fatores, que são processados (analisados/identificados) e o resultado é o ato inseguro (que pode ser uma causa humana ou diversos fatores que envolvem o elemento humano ou um conjunto de falha humana/falha operacional/projeto)
Na Gerência de Risco, temos uma visão mais ampla do que é o ato inseguro (denominação das falhas relativas ao ser humano) em relação a todos os riscos que envolvem  uma empresa
Existe uma série de acidentes industriais que a causa principal foi a falha humana. O erro humano faz parte do processo e que devemos criar barreiras de segurança para dificultar a sua execução. Mas o errar é inerente  ao ser humano.
Houve uma colisão aérea em que morreu 79 passageiros a maioria crianças, entre um avião passageiro russo e um cargueiro. O avião de passageiro tinha um detector automático de risco de colisão na  cabine, e avisou o piloto que  ele estava na rota de colisão com o cargueiro, ma o piloto do avião que transportava as crianças obedeceu ao controlador de vôo sobrecarregado que estava em terra. E houve a colisão.
Trecho de análise feita por um jornalista do New York Times:
O piloto, até o ponto em que teve tempo para pensar, deparou-se com a necessidade de avaliar a confiabilidade do controlador de vôo em comparação com a dos engenheiros anônimos que construíram o detector destinado a evitar colisões.

No fim, ele seguiu a recomendação da voz com que ele se identificava mais. A máquina não tinha chances. Para o bem ou para o mal, isso é parte do nosso programa. É da natureza dos seres da nossa espécie optar por cometer seus próprios erros. 

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posted by ACCA@3:47 PM