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sexta-feira, junho 02, 2023

MEMÓRIA: O DIA EM QUE O BRASIL ASSISTIU AO PIOR INCÊNDIO DE SUA HISTÓRIA


O Gran Circo chegou a Niterói no dia 8 de dezembro de 1961 e foi montado na Praça do Expedicionário, em frente à Estação Leopoldina. O mastro principal media 17 metros de altura e a lona, feita de algodão e revestida de parafina, pesava seis toneladas.

Para ajudar na montagem, o dono do circo, o gaúcho Danilo Stevanovich, contratou 50 operários. Depois de armado, o Gran Circo ocupou um diâmetro de 50 metros em um terreno baldio que, aos sábados e domingos, servia de campo de futebol improvisado para a garotada da vizinhança. O circo estreou em Niterói na noite de 15 de dezembro, uma sexta-feira, com lotação esgotada.

O Gran Circo era formado por 40 artistas, como palhaços, trapezistas e domadores, e 150 animais, como leões, girafas e elefantes. O circo tinha capacidade para 3,4 mil espectadores, divididos por nove arquibancadas, 800 cadeiras e 25 camarotes. O circo era dividido em nove arquibancadas de madeira, 800 cadeiras de ferro e 25 camarotes

Cada uma das 10 sessões do Gran Circo em Niterói começava com um número de domadores de leões e terminava com outro de trapézio.

Foi um dos integrantes dos Flying Santiago, aliás, a primeira pessoa a gritar “Fogo!” naquela tarde calorenta de 17 de dezembro.

A trapezista Nena, nome artístico de Antonietta Stevanovich, irmã de Danilo, tinha acabado de fazer seu número quando avistou, por volta das quatro e vinte da tarde, as primeiras labaredas, a cerca de 20 metros da entrada principal. O fogo começou na parte de baixo da lona. Ela e os outros dois trapezistas, Santiago Grotto e Vicente Sanches, conseguiram escapar ilesos pela porta dos fundos. Na fuga, centenas de sapatos, sandálias e chinelos foram deixados para trás


'CORREDOR DA MORTE'

A maioria tentou sair por onde entrou. Para chegar sãos e salvos do lado de fora, tinham que atravessar um túnel de treze metros de comprimento por quase quatro de largura. No caminho, dois gradis de ferro usados para facilitar a entrada do público dificultavam sua fuga. Perto do fim da sessão, seriam retirados. Mas, com o incêndio, ninguém se lembrou disso. Conclusão: o tal túnel ganhou o macabro apelido de “corredor da morte”.

O incêndio do Gran Circo durou apenas 10 minutos. Mas deixou, segundo estimativas oficiais, 503 mortos — sete em cada dez eram crianças.

“Jamais tantos brasileiros morreram em tão pouco tempo e no mesmo lugar”, afirma Ventura.

O incêndio da Boate Kiss, em 27 de janeiro de 2013, registrou 242 vítimas fatais e do edifício Joelma, em 1º de fevereiro de 1974, 188.

Parentes e amigos tinham dificuldade para reconhecer seus mortos e feridos, de tão   carbonizados que estavam,

Quando todos imaginavam que aquele pesadelo não poderia piorar, o que restava da lona de algodão parafinado despencou, em chamas, sobre a multidão. Na ânsia de proteger o rosto, muitos sofreram queimaduras de terceiro grau nas mãos e nos braços.


QUEIMADURAS EM TODO O CORPO

O número de mortos no incêndio foi tão grande que o então governador do Rio, convocou todos os marceneiros de Niterói para fabricarem quatrocentos caixões.

O estádio Caio Martins, com capacidade para 12 mil torcedores, foi transformado em uma imensa oficina de carpintaria. Se faltavam caixões para inúmeros cadáveres, também faltavam sepulturas para incontáveis enterros.

Do lado de fora do circo, também faltavam ambulâncias para tantos feridos. Muitos foram socorridos em táxis, ônibus e caminhões.  

Nas unidades superlotadas, as vítimas esperavam por atendimento médico em todo e qualquer canto: deitadas nos corredores, sentadas no chão, estiradas nas macas... “Perdi mais de 60 crianças. Não conseguia socorrer a todas ao mesmo tempo”, lamenta o cirurgião plástico Ronaldo Pontes, que dava plantão no Hospital Pediátrico Getúlio Vargas Filho.

'MONSTRO INCENDIÁRIO' OU BODE EXPIATÓRIO?

A suspeita da polícia recaiu sobre Adilson Marcelino Alves, o Dequinha, um dos 50 operários contratados por Stevanovich para ajudar na montagem do circo.

Denunciado por um funcionário, Maciel Felizardo, foi preso e interrogado. Em seu depoimento à polícia, confessou ter ateado fogo à lona. “Se eu soubesse que ia morrer tanta gente, não teria feito o que fiz”, declarou o rapaz.

Foi condenado a 16 anos de prisão. Seus cúmplices, Walter Rosa dos Santos, o Bigode, e José dos Santos, o Pardal, também cumpriram penas — de 16 e 14 anos, respectivamente.  

AINDA HOJE, A CAUSA DO INCÊNDIO DIVIDE OPINIÕES.

“Para uns, Dequinha era um ‘monstro incendiário’. Para outros, um bode expiatório. Afinal, interessava às autoridades encontrar logo o culpado”, explica Ventura.

Há quem acredite na hipótese de acidente. Neste caso, a versão mais provável é a de curto-circuito.

“O que mais me chamou a atenção foi a ausência de fiscalização”, observa a historiadora Ana Maria Mauad, do Laboratório de História Oral e Imagem (LABHOI) da Universidade Federal Fluminense (UFF). “Deixaram instalar um circo para mais de 500 pessoas com lona altamente inflamável e sem controle de segurança das instalações elétricas”. Fonte: BBC Brasil - 4 abril 2023

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posted by ACCA@5:10 PM