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terça-feira, setembro 05, 2006

Caso Real - Diário de Obra de um Observador

9 de novembro de 2005
Descrição do prédio em construção: padrão luxo, 01 apto por andar, 18 andares, 01 duplex, piscina coberta e garagem.
A obra localiza-se próxima ao local onde eu trabalho, pude observar o trabalho de um operário, efetuando acabamento em um pilar. Ele estava em um andaime metálico, a 6 m de altura, tendo como piso, uma tabua apoiada nas extremidades do andaime. Ele estava usando o cinto de segurança, tipo pára-quedista, com a corda de segurança ancorada na própria tábua ?

Muito provável, ele pesava mais de 60 kg. Caso houvesse a queda do operário, a tabua não suportaria o peso do operário com a sobrecarga devido aceleração em queda livre ou em caso da instabilidade da estrutura. do andaime, ele sofreria uma queda muito mais grave.

Ao mesmo tempo, no ultimo andar (vigésimo andar), prédio em construção de alto padrão, outro operário estava cortando pontas de ferragens com maçarico, caindo fagulhas e ferragens no solo (queda livre, 60 m).

11 de novembro de 2005
O prédio em fase de acabamento. O acabamento externo (fachadas) está sendo executado por painéis de concreto de comprimento de 1,20 m. Os painéis são fixados por grampos de aço.

No caso em questão, o operário está trabalhando no último andar (vigésimo) num pilar mais externo, que tem um beiral para ele circular.

A grua que fica no topo do prédio faz o içamento da peça (do térreo para o vigésimo andar). A movimentação da grua com a peça fica no lado direito mais externo do operário, ela movimenta a peça lentamente junto ao operário.

O operário está com cinto de segurança tipo pára-queda conectado a corda de segurança que fica a sua direita, na mesma posição de movimentação da peça, para fazer o encaixe no pilar.

Caso houver um problema com o painel na operação de encaixe , a corda de segurança que fixa o operário está no mesmo sentido da projeção de queda do painel. Se operário perder o equilíbrio junto com à peça, ele será puxado na mesma direção da queda da peça.

O ideal nesse caso a corda de segurança ficaria no lado oposto de trabalho do operário. Em caso de queda do operário, ele seria puxado para o lado esquerdo e a peça cairia para o lado direito.

Outra coisa de difícil solução é a movimentação dos operários no último andar, utilizando pontos de segurança para fazer a conexão com o cinto de segurança. Alguns são no piso, o que provoca o atrito da corda como concreto, que é prejudicial à vida útil da corda.

28 de Fevereiro de 2006
O prédio em fase final de acabamento, a empreiteira está colocando uma grade no perímetro da construção. A grade de quase 5 m (parece-me, que hoje, não sabemos quem está dentro ou fora de um presídio), em uma das secções estava um operário no topo unindo as secções contíguas.
No topo, o operário montado na grade, com os pés apoiados numa travessa de madeira (a grade é quadrilátera), sem cinto de segurança, calmamente executando o serviço de amarração das grades. Em uma das etapas, um operário no solo, joga o equipamento de solda elétrica para ele .
Ele começa a soldagem, com um dos antebraços funcionando como um anteparo da visão e outro braço segurando o soldador. É um equilibrista. No solo, o mestre de obra e mais dois operários olhando o serviço. Hoje preenchemos ou estamos mais preocupados com tantos formulários, formulário disso, formulário daquilo, obedecer aos trâmites legais oficiais, etc.É um filme de ficção de formulários. Na prática o filme é real e perigoso. No Brasil as normas mudam ou as pessoas mudam, mas as lições de acidentes são esquecidas. Os acidentes se repetem

Em 27 de abril de 2006
Agora em fase de limpeza e acabamento final. Na sacada do mezanino do prédio, estavam engenheiros, mestre de obra e outros conversando e ao lado, na sacada possui uma grade em todo o perímetro, um funcionário limpando a grade, pelo lado externo, apoiado no beiral da laje, uma mão segurando na grade e a outra limpando, sem EPI (cinto de segurança) a 8 m de altura. E o papo entre os profissionais continuava.
Enquanto isso, no térreo, uma piscina com cobertura (estrutura de concreto armado, colunas e vigas, cobertura de policarbonato, em forma de retângulo), vários funcionários caminhavam tranqüilamente nas vigas (esp. 50 cm), sem sapatos, sem EPI a 6 m de altura.
Os funcionários caminhavam de lado, de costa, e alguns estavam agachados de costa para o lado externo da viga e outros conseguiam andar entre os encaixes das telhas. Logicamente tudo isso, com a piscina vazia. E o papo entre os profissionais no mezanino continuava.
Como se dizem, os relatórios oficiais elaborados conforme a lei, enquanto isso o risco está correndo solto na obra.
ACCA

posted by ACCA@10:10 PM