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quarta-feira, março 11, 2009

Lembrança – Tragédia em Guadalajara

Uma série sucessiva de explosões na rede coletora de esgoto da cidade de Guadalajara, a segunda maior cidade mexicana, provocou mortes e deixando um rastro de destruição ao longo da linha da rede coletora de esgoto de aproximadamente 8 quilômetros, de casas e veículos destruídos. As explosões, ocorreram a partir das 10 horas da manhã (13 horas em Brasília), 22 de abril de 1992, foram provavelmente causadas por vazamento de gás.

Guadalajara
Guadalajara, capital do estado de Jalisco, tem cerca de 4 milhões de habitantes e está localizada a 570 quilômetros a noroeste da Cidade do México, a. capital do país. Cerca de 150 mil pessoas vivem nos bairros do Setor Reforma, onde ocorreu o acidente.

Suspeita do vazamento
A primeira suspeita recaiu sobre a empresa Petróleos Mexicanos (Pemex), que mantém um gasoduto que une Guadalajara à Cidade do México. Um porta-voz da em­presa assegurou, no entanto, que as explosões não tinham se iniciado nas tubulações de óleo e gás. Apesar disso, o exército fechou de imediato o tanque 18 da Pemex, localiza­do no sul da cidade, próximo à região do acidente. A empresa Petróleo Mexicano (Pemex) alegou que as explosões começaram com um vazamento de gás hexano na tubulação de esgoto de Guadalajara. O porta-voz da Pemex, Jorge de la Rosa, disse que o vazamento estaria ocorrendo na companhia Aceitera la Central.

Empresa de óleo nega culpa em explosões
Embora a causa real da cadeia de explosões que ocorreu seja ainda um grande mistério, os técnicos da Pemex têm pelo menos uma explicação sobre o vazamento de gás hexano da fábrica "La Central", concentrando‑se na rede de esgotos. De acordo com as informações dos peritos, o hexano é um solvente extremamente volátil, incolor, insolúvel em água, letal e narcótico quando circula em grandes quantidades. Apontada como responsável pela tragédia, a "La Central" foi imediatamente fechada pelas autoridades.
Entretanto, a direção da fábrica não assumiu qualquer responsabilidade pelas explosões, como ficou claro num comunicado transmitido por uma emissora de rádio em cadeia nacional. A empresa admitiu apenas que utiliza o hexano no processamento de óleo, que mantém 60 mil litros armazenados dentro de rígidas normas de controle. Qualquer fuga do produto, destacou o comunicado da empresa, teria sido imediatamente identificada.
A fábrica de óleo e o terminal "La Nogalera" da Pemex, acoplado a um oleoduto que passa por Guadalajara, procedente de uma refinaria na cidade de Salamanca, estão instalados numa zona industrial e todos os rejeitos da região transitam pela canalização que explodiu.

Foi como um terremoto
"Foi como se tivéssemos assistido a um grande terremoto, com a destruição total de edifícios e casas” descreveu Agustin Rios, um dos coordenadores da Cruz Vermelha. Na área, densa­mente povoada, havia ônibus destroçados nas ruas e carros semi‑engolidos pelas fendas produzidas pela explosão.
"Estamos numa catástrofe", declarou o porta-voz do governo do Estado de Jalisco, Juan Guzman Flores. "É como se tivesse ocorrido um terremoto de 6 ou 7 graus na escala Ritcher", comentou. "As ruas têm buracos de até 15 metros de profundidade. Há carros sobre as casas e pendurados em árvores".

Equipe de emergência e voluntários
Centenas de voluntários juntaram-se aos bombeiros nas ações de resgate das vitimas, muitas soterradas em fendas abertas nas ruas e nos quintais. O presidente do México, Carlos Salina de Gortari, que no momento das explosões realizava visita ao Estado de Vera Cruz, retornou em seguida à capital. Dali, pretende coordenar o trabalho de assistência às vitimas do acidente.
"Parecia um campo de batalha", comentou um radialista. As reportagens de rádio falaram em dez explosões, 50 casas ruíram e centenas de carros foram destruídos. A Cruz Vermelha informou que pelo menos 150 mil pessoas moravam no local onde se concentraram as explosões, cerca de 12 quadras.

Moradores reclamaram do cheiro de gás
Desde 20 de abril, os moradores dos bairros Olímpicas e Analco advertiam as autoridades para o forte cheiro de gás exalado pelos bueiros das ruas. Membros do ser­viço público vistoriaram as redes de esgotos e de escoa­mento de águas pluviais. Em um coletor de água, a nove metros de profundidade, os técnicos encontraram gasolina, gases e azeite. Em seguida, destaparam os bueiros para permitir a saída dos gases.

Infraestrutura da região foi afetada
Durante a noite, ainda não havia sido restabelecido o fornecimento de água e energia elétrica e os telefones continuavam mudos na região afetada. Técnicos trabalhavam para detectar a origem exata do vazamento. Durante à tarde, três pequenas explosões ocorreram em bolsões de gás mantidos entre as galerias.

Galerias – rede de esgoto
As autoridades receberam chamadas de moradores de vários pontos da cidade revelando a existência de fortes odores, sem o registro de novas explosões. E, em praticamente toda a cidade, trabalhadores do governo e voluntários estavam limpando bueiros e destapando as redes de esgoto, na tentativa de permitir a circulação de possíveis fluidos que estejam retidos na rede subterrânea.

Desabrigados estão em albergues improvisados
Assustados, alguns chorando e perguntando o que fazer, milhares de pessoas não existe um número oficial estão desde a noite de 22 abril, vivendo em albergues improvisados, espalhados por vários bairros da cidade. Um dos primeiros albergues instalados está funcionando no Parque Montenegro, próximo ao aeroporto internacional. Barracas de lona acomodam cinco ou seis pessoas, em geral da mesma família. As histórias não variam muito.
Carmen Garcia, moradora da rua Pedro Gante, saiu correndo da sua casa quando escutou um forte estrondo. Desesperada, começou a andar sem parar, até que encontrou conhecidos na mesma situação e todos dirigiram‑se ao parque Montenegro, onde começaram a chegar os primeiros cobertores, água mineral, bolachas, pão de forma e leite em pó. Carmen não sabe exatamente o que aconteceu com sua casa e como todos os desabrigados não sabe quando poderá entrar na rua onde mora desde que nasceu.
Maria Solis tem o consolo de saber que sua casa esta inteira. Teve tempo para pegar algumas roupas, enquanto policiais evacuavam toda a rua. Numa barraca do Parque Montenegro ela disse que estava contente por estar viva, porém preocupada com a sorte dos seus vizinhos.
Pelo menos outros 20 albergues estão funcionando em Guadalajara em escolas e igrejas. No estádio de futebol da Universidade de Guadalajara algumas famílias também estão sendo atendidas.

Balanço da tragédia
Vítimas : 300 mortes, 1.500 feridos
Danos materiais : Uma faixa de 8 km de casas e veículos destruídos

Prejuízos estimados
Os prejuízos foram calculados em 75 milhões de dólares.

Causa da explosão: corrosão no oleoduto da Pemex
Pelos menos nove explosões em intervalos separadas foram ouvidas, começando em aproximadamente 10 h da manhã, horário local. A explosão abriu uma trincheira irregular que percorreu quase 8 km. A trincheira expandida foi considerada contígua com o sistema de esgoto de cidade, e os buracos abertos tinham pelo menos seis metros de profundidade e três metros transversalmente. Em vários locais, muitas crateras maiores de cinqüenta metros de diâmetro tragaram numerosos veículos. .
Foi instalada uma tubulação de água, por um empreiteiro, vários anos antes da explosão, que vazou água no oleoduto de gasolina que estava no nível mais inferior.A corrosão subseqüente do oleoduto de gasolina, em volta, causou o vazamento de gasolina nos esgotos.

Inquérito final
O relatório da Procuradoria Geral da República, atribuiu as explosões ao vazamento de gasolina que "saiu da tubulação da Pemex". Logo após a tragédia, a Pemex e o governo local culparam uma pequena fábrica de azeite.
Depois de ser considerada responsável pela tragédia, a Pemex anunciou que dará US$ 33 milhões para ajudar a reconstruir as áreas atingidas pelas explosões. A Pemex é a principal indústria do México.
A Procuradoria Geral da República, determinou a prisão do prefeito Enrique Dau e do secretário estadual de Desenvolvimento Urbano, Aristeu Mejia, além de superintendentes e técnicos da Pemex. Diretores do serviço de abastecimento de água da cidade também serão detidos. A prisão do prefeito depende de aprovação da Assembléia Legislativa local.

Acidente está entre os maiores registrados na história mexicana
A cadeia de explosões que ocorreu em Guadalajara é uma das piores desastres desse tipo da História. Segundo o porta-voz do governo do Estado de Jalisco, Juan Guzman Flores, os estragos causados pelas explosões foram semelhantes aos de um terremoto com cerca de sete graus na escala Richter, que tem como índice máximo o valor nove. O terremoto que destruiu 30% da capital mexicana e matou cerca de 10 mil pessoas em setembro de 1985, atingiu 7,8 pontos por essa mesma escala..
As explosões em Guadalajara­ só são superadas em número de vítimas e prejuízos por uma explosão de gás líquido ocorrida em novembro de 1984 na refinaria da Petróleos Mexicanos (Pemex), num subúrbio da Cidade do México.
Nessa explosão, seguida de um enorme incêndio, todo o bairro de San Juan de Ixhuatepec foi destruído, provocando a morte de 452 pessoas, ferimentos em 3 mil e deixando desabrigadas outras 10 mil. Na maior explosão provocada por vazamento de gás ocorrida es­te ano, na capital da Armênia, Erevan, morreram 21 pessoas, 18 ficaram feridas e vários imóveis foram destruídos.

Análise da tragédia

Oito quilômetros de ruas principais danificadas pelas explosões mais outros quatro quilômetros de ruas perpendiculares foram os destroços imediatos das explosões.
A área talvez mais danificada pelos destroços mas também pela densidade de habitantes corresponde ao cruzamento das ruas Sante e 20 de Novembro em Las Conchas, que corresponde ao centro do velho bairro de Analco.

Crescimento desordenado da região
O crescimento urbano da zona, acelerado a princípios dos anos 70 foi combinando áreas residenciais com instalações industriais e, sobretudo, com comércios diversos mas a maioria associada com a indústria de automóvel (auto peças).
A pobreza urbana, que constitui um alto componente de vulnerabilidade frente aos desastres, somada à convivência com instalações perigosas, configurou o quadro de alto risco que se concretizou no desastre produzido pelas explosões.

Falta de fiscalização pelo poder público
Por outro lado, aumentando a alta vulnerabilidade da população da área, as autoridades omitiram-se de toda ação preventiva com respeito à vigilância das instalações perigosas, de regulação ou readequação do uso do solo, e também há que agregar as próprias omissões da Pemex (empresa Petróleos Mexicanos).

Finalmente, as autoridades que não deram importância às reclamações dos moradores com respeito aos intensos cheiros de solventes que emanavam das galerias, declarando a inexistência de perigo e situação sob controle, constitui o antecedente que agregado aos detalhes técnicos que explicam a presença de gasolina na galeria, serviram para produzir o desastre.

Falta de estrutura do governo para emergência
A organização governamental falhou. Pôs em evidência que o organismo criado para atender desastres como o Sistema Estatal de Proteção Civil não existia em termos reais, salvo em seu decreto de criação. O governo estatal e municipal careceu de toda imaginação, a falta de um plano de contingências, para enfrentar o desastre. Interveio depois o Sistema Nacional de Proteção Civil que enviou ao local o responsável do Programa Nacional de Solidariedade.

Prejuízos
A Câmara Nacional de Comércio (Canaco) da cidade do México, assinalou que dos 10 mil estabelecimentos comerciais na zona metropolitana, 519 se viram afetados, dos quais 50 se reportaram com danos consideráveis, resultando cerca de 2.800 empregos perdidos pelo menos em três a quatro meses.
Um aspecto particular que teria que considerar é a dos mercados público. Por efeitos das explosões foram fechados os mercados da região (8).

Poderíamos tentar imaginar aqui as perdas imediatas em todos os produtos perecíveis acumulados, a perda em salários e o corte drástico por várias semanas na cadeia de distribuição.

Algo parecido ocorreu com as feiras-livres, duas localizadas nesse dia na zona próxima à explosão, e a cancelamento por bastante tempo das outras que se costumavam instalar na zona evacuada em outros dias da semana.

O CCIJ – Conselho de Câmaras Industriais de Jalisco declarou por sua parte em 6 de maio de 1992;
■ 79 empresas sinistradas (mais outras duas que registrou posteriormente),
■ 466 indústrias fechadas e 14.700 trabalhadores parados por causa da explosão.
■ Assinalou que se precisaria cerca de 4 milhões de dólares para procurar a reinstalação de cerca de 3 mil trabalhadores nas 81 empresas sinistradas. Por contribuir uma quantidade média, posterior à explosão e durante o tempo que durem as paralisações das empresas, a CCIJ estima um prejuízo diário de 320 mil dólares .

As empresas fechadas perdiam ao redor de 320 mil dólares diários, também segundo os cálculos do diretor da Companhia Siderúrgica de Guadalajara. O diretor disse, que cerca de 750 trabalhadores estão parados, sem produzir aço e os fornos paralisados necessitam de vários dias para voltar a funcionar uma vez que se reiniciasse a atividade.

A catástrofe provocou graves prejuízos no setor produtivo não somente de Guadalajara, também para o país. A reativação das empresas paralisadas foi lenta; as sinistradas demorarão mais em retornar as atividades para começar a produzir, já que muitas terão de mudar-se. Contaram com créditos do governo e das Câmaras Industriais e em muitos casos já procederam as indenizações.

Fontes:
Agência Estado, Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo, no período de 22 de abril a 27 de abril de 1992.
“Las explosiones de Guadalajara”- Revista de la Red de Estudios Sociales en Prevención de Desastres en América Latina – 1993


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