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quarta-feira, março 06, 2013

Nas rodovias, 14,7 milhões de bichos são atropelados a cada ano


A cada minuto, 28 animais são atropelados nas estradas brasileiras. Carros, motos e caminhões retiram a vida de 14,7 milhões de bichos por ano (40,8 mil a cada dia), de acordo com estimativas de especialistas. É um massacre que, muitas vezes, sequer é percebido pela maioria dos motoristas. Como a quantidade de rodovias monitoradas no país é reduzida, a estimativa é que essas estatísticas estejam subestimadas.

Nos Estados Unidos,  onde o controle é bem mais rigoroso, os números são cerca de 25 vezes maiores: 365 milhões de animais mortos por ano (um milhão por dia).

ATROPELAMENTO
A principal causa direta de mortalidade de animais vertebrados no Brasil é o atropelamento, ressalta o biólogo Rodrigo Santos, analista ambiental do Instituto Brasília Ambiental (Ibram, órgão executor de políticas públicas ambientais e de recursos hídricos no Distrito Federal). Desde 2010, ele faz parte do grupo que monitora as estradas que passam perto de cinco unidades de conservação do DF. De abril daquele ano até setembro último, os especialistas do projeto Rodofauna observaram 2.324 animais mortos em 25.170 quilômetros percorridos. A grande maioria (86,4%) foi de animais silvestres.

É notório o atropelamento de propósito, principalmente de cobras, muitas vezes no acostamento. Esse comportamento é cultural no país: tem que matar bicho, afirma Santos. É raro, mas, às vezes, conseguimos encontrar os animais ainda vivos. Há pouco tempo resgatamos uma fêmea de gambá ou saruê. Ela tinha quatro filhotes, um deles sobreviveu e acabou sendo encaminhado para o centro de triagem. Mais do que criar as bases estatísticas da mortandade de animais atropelados, os pesquisadores do Rodofauna estão mapeando os pontos de maior incidência do problema. As informações vão municiar o relatório que está em fase de conclusão. Vamos propor medidas mitigadoras, como, redutores de velocidade,  diz Santos.

A enorme quantidade de bichos mortos em rodovias mostra o tamanho do desafio dos pesquisadores que pretendem diminuir os atropelamentos. O impacto ambiental já começa com a própria construção da estrada, que se transforma em uma barreira impedindo ou dificultando a circulação dos animais. Quanto mais preservada for a área cortada pela via, mais grave é o problema.

SUPRESSÃO DE FLORESTAS
Por outro lado, a contínua supressão de florestas, que abrigam os animais silvestres, seja por conta do crescimento das cidades ou por qualquer outra atividade, aumenta a necessidade de circulação deles não apenas para buscar alimentos, mas também para encontrar abrigo e mesmo parceiros. Quando, no meio do caminho dos bichos, há rodovias, o risco de acidentes é alto, sobretudo num país de dimensões continentais que adotou a rodovia como principal meio de transporte tanto de pessoas quanto de cargas. E que continua abrindo novas vias, como as que foram previstas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Trata-se de um fenômeno que, individualmente, vemos apenas parcialmente: um bicho morto aqui, outro acolá. Entretanto, quando computados em sua totalidade, os números são realmente impressionantes, ressalta o biólogo Mozart Lauxen, que lida com este problema nos processos de licenciamento ambiental de rodovias que passam pelo Ibama, onde trabalha como analista ambiental há nove anos.

IMPACTO AMBIENTAL
Por exemplo, quando há a decisão de construir uma rodovia, é necessário identificar e mensurar seu impacto ambiental. Se a estrada causa a fragmentação de uma área de floresta, é importante analisar a possibilidade de traçados alternativos, que desviem as vias de regiões ambientalmente importantes.
Outro caminho é a mitigação do dano, que pode ser feita lançado-se mão de uma série de ferramentas, como a exigência de construção de estruturas de passagem de animais, tanto por baixo da pista como por cima.

EXEMPLO DE PASSAGENS PARA ANIMAIS
Duas dessas passagens foram instaladas na BR-040, que une o Rio a Juiz de Fora, em Minas Gerais. Exceção brasileira, a via tem seus 180 quilômetros monitorados desde 2007 pela equipe da bióloga Cecília Bueno, professora da Universidade Veiga de Almeida.
A biólogo conta com o apoio da concessionária que administra a via, qualquer atropelamento de animais silvestres é registrado pelo projeto Caminhos da Fauna nos sete dias da semana, 24 horas por dia. A Concer não só banca os custos como mobiliza os operadores de trânsito, que atuam em tempo integral e, depois de passar por um treinamento, documentam cada caso.

Mapeamos os pontos mais críticos, onde os animais circulam mais. Isso geralmente acontece em locais próximos de unidades de conservação ou em áreas de campo. A partir desta informação, é possível implantar medidas para reduzir os atropelamentos. Na Baixada Fluminense, por exemplo, colocamos uma tela ao longo da pista e conseguimos reduzir a praticamente a zero o número de casos. Houve apenas um, porque a tela se rompeu, ressalta Cecília.
Medidas simples podem surtir grande efeito. Alguns animais, porém, conseguem superar os obstáculos. As aves geralmente acessam a rodovia por cima. Outro problema é a ocupação desordenada das áreas às margens das estradas. É uma situação assustadora e o pior, é que não podemos colocar telas e barreiras onde há pessoas circulando.

Apesar de tanto esforço, todos os dados gerados por este e por outros projetos de monitoramento,  não são aproveitados por um banco de dados brasileiro.

LICENCIAMENTO DE NOVAS CONSTRUÇÕES
Para orientar o licenciamento de novas construções, especialistas estão analisando as diferenças entre os impactos de pistas de terra em comparação com as asfaltadas. Também há estudos comparando as vias duplicadas das simples, além da eficácia das passagens para animais.

 Há muito mais atropelamentos nas ruas asfaltadas e duplicadas; o tráfego nas pistas de terra é muito menor. Também é necessário analisar o local da estrada: quanto mais preservada a floresta, maior o impacto. A velocidade é outro fator importante, assim como os dispositivos de controle dos limites da pista. Alguns trabalhos falam que redutores de velocidade diminuem a incidência dos atropelamentos, enumera Rodrigo Santos, analista ambiental do Ibram. Há especialistas que criticam a estrada-parque porque nessas regiões o fluxo de animais é grande.

Além disso, a estrada corta essa passagem de bichos, diminuindo a viabilidade das populações dos animais, principalmente os menores, com deslocamento mais curto. Tudo isso acaba influenciando o impacto da rodovia; sem falar no possível aumento da erosão.

POLUIÇÃO SONORA
O barulho dos motores é outro aspecto que preocupa os especialistas. Há trabalhos que tentam relacionar as taxas de reprodução de anfíbios com a poluição sonora. Nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, a arquitetura de boa parte das novas estradas já precisa prever áreas de passagens para animais. Em alguns casos, as zoopassagens se misturam com a floresta ao redor.

A bióloga Sandra Jacobson, que trabalha na agência florestal americana (USDA Forest Service), afirma que estes caminhos para bichos muitas vezes são as únicas maneiras de reduzir a mortalidade de algumas espécies nas proximidades das rodovias.
Dois impactos são os maiores problemas das rodovias;
■O maior deles é a barreira aos animais selvagens, que não podem se mover livremente pelas estradas. Os bichos, como as pessoas, precisam buscar alimentos, parceiros e abrigo. A fragmentação do habitat muitas vezes torna impossível a sobrevivência dos animais, analisa a especialista americana.
■ O segundo maior impacto é a mortalidade causada pela colisão dos animais com os veículos. Como se observa, este problema ocorre em todo o mundo e pode causar sério declínio em algumas populações de animais.
O custo destas passagens para animais, porém, pode inviabilizar a construção delas em alguns casos, salienta Sandra. Apesar de eficazes, as zoopassagens são caras e não resolvem todos os problemas ambientais. É melhor ter menos estradas que sejam muito bem desenhadas e com mais tráfego do que muitas rodovias com menos carros. Fonte: Globo - 27/11/12

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